Novas perspectivas para soluções de conflitos judiciários

Constelação Familiar, Advogado Peacemaker, Direito Holístico. Novas perspectivas para soluções de conflitos.

O judiciário brasileiro é um dos três poderes do Estado que está incumbido de interpretar e aplicar a lei nos litígios entre os cidadãos e entre os cidadãos e o Estado[1]. Para alcançar a solução dos litígios, é indispensável que sejam respeitadas todas as leis, princípios, instruções normativas, e demais dispositivos que estabelecem o regramento a ser seguido.

Estes dispositivos preveem desde a proibição de determinada conduta (por exemplo: proibição de enriquecer ilicitamente às custas de outrem, art. 844 do Código Civil), até os prazos e recursos que devem ser observados no curso do processo (por exemplo: prazo para apresentar defesa art. 335 do Código de Processo Civil, prazo para recorrer da sentença (apelação) art. 1.009, §1º do Código de Processo Civil).

Ocorre que, para que o respeito de todas as disposições legais possa ser observado, o judiciário se vê “engessado” no que diz respeito à sua agilidade/eficiência para apresentar a solução ao litígio. Isto porque, a não observância de um dispositivo legal, pode gerar uma nulidade, sob o argumento de violação ao direito. Esta nulidade pode acarretar o retorno do processa ao estágio inicial ou a estágio anterior ao atual.

Por outro lado, a estrita observância das previsões legais, pode significar a apresentação de recursos e manobras processuais, que, embora estejam em conformidade com a legislação, contrapõem os interesses das partes no que diz respeito ao tempo e eficiência do processo.

Com o objetivo de aferir a satisfação do judiciário, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) realizou uma pesquisa[2], que demonstrou: 62,7% das vezes as audiências não são realizadas no horário, 56,7% das vezes os processos nunca são concluídos no prazo previsto na forma da legislação.

A insatisfação com a morosidade e ineficiência com o método judicial de solução de conflitos é cada vez mais recorrente nos dias atuais. O próprio CNJ editou a Resolução 125/2010, que criou a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos no âmbito do Poder Judiciário. Por tratamento adequado dos conflitos, entende-se por assegurar a todos o direito à solução dos conflitos em conformidade com a sua natureza e peculiaridade.

Dentre estes “meios adequados”, é possível mencionar a Constelação Familiar (também conhecida como Constelação Sistêmica[3]), método através do qual se pretende a humanização das práticas de conciliação no Judiciário[4]. Este método foi criado pelo psicólogo alemão Bert Hellinger, onde se busca esclarecer para as partes o que há por trás do conflito que gerou o processo judicial.

A Constelação Familiar investiga as relações interpessoais de determinado sistema familiar, mostrando as conexões entre as gerações. Esta investigação propicia a solução do conflito no seu âmago, e não somente no âmbito material.

Em geral, os conflitos entre pessoas são provocados por motivos mais profundos do que meros desentendimentos pontuais. Em um processo judicial, raramente os reais motivos do litígio são discutidos, pois o que se pretende, em regra, é sanar/evitar um prejuízo material.

Ocorre que, a solução do problema material nem sempre traz concomitantemente a solução do litígio em si. E é neste aspecto que a Constelação Familiar atua.

Os conflitos levados para uma sessão de constelação, em geral, versam sobre questões de origem familiar, como violência doméstica, endividamento, guarda de filhos, divórcios litigiosos, inventário, adoção e abandono.

No Brasil, o juiz da Comarca de Valença – Bahia, Sami Storch, foi o precursor desta técnica em 2012. Na prática, as partes dos processos são convidadas a participar de Constelações Familiares de forma voluntária, e a eventual negativa do convite não interfere no andamento ou resultado do processo.

Desde então, o tema vem se propagando, sendo apoiado, inclusive pela Ordem dos Advogados do Brasil, através de cursos virtuais[5].

Paralelamente as inovações nos métodos de solução de conflitos, tem-se também a modernização da concepção do próprio operador do direito, o advogado.

Isto porque, desde o início da formação dos advogados, nas faculdades, a cultura do litígio é instituída e tida como correta.

Com o tempo, a insatisfação com o método judicial de solução de conflito, os advogados igualmente foram se adequando as novidades relativas aos métodos adequados de solução de conflitos.

Isto significa alterar a ótica pela qual o litígio é vislumbrado, significa não enxergar somente prazos, condenações, manifestações, audiências. Mas sim entender o real motivo do conflito, e buscar, juntamente com as partes, a solução adequada.

O advogado peacemaker, que tradução literal significa advogado pacificador, teve origem no exercício da advocacia norte americana, e suas interfaces com a abordagem sistêmica do profissional do direito[6].

O advogado pacificador parte da premissa que, para solucionar um conflito, não é necessário que ele chegue até o judiciário. Ele possui características como compreensivo e cooperativo, pois tem como propósito a solução do conflito sem o ajuizamento de uma ação.

Neste contexto, percebe-se o início de uma mudança cultural no Direito, que passa da cultura do litígio, para a cultura pacificadora. E mais, que aceita intervenções de métodos interdisciplinares, como a Constelação Familiar.

Esta multidisciplinariedade é característica primordial do Direito Holístico[7], que é o ramo em que se busca correlacionar a ciência jurídica com outras, tais como psicologia, filosofia, terapias alternativas[8] (dentre elas a Constelação Familiar), etc.

As mudanças são expressivas, e revelam o intuito de alterar o método de solução de conflito que é atualmente utilizado pelo Judiciário Brasileiro.

Os advogados processualistas tendem a repudiar os métodos extraprocessuais de solução de conflitos, pois entendem que nestes casos, há a violação de direitos fundamentais das partes.

Contudo, tendo em vista a primazia da vontade das partes, o método de solução de conflitos a ser aplicado em cada caso, deve ficar à cargo das partes escolherem.

[1] Conceito disponível em: https://jb.jusbrasil.com.br/definicoes/100000836/poder-judiciario

[2] Disponível em: http://www.cnj.jus.br/gestao-e-planejamento/gestao-e-planejamento-do-judiciario/pesquisa-de-satisfacao-e-clima-organizacional

[3] Disponível em: https://direitosistemico.wordpress.com/

[4] Disponível em: http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/83766-constelacao-familiar-ajuda-humanizar-praticas-de-conciliacao-no-judiciario-2

[5] Disponível em: https://www.oabmg.org.br/Noticias/Index/8769/OAB_Minas_disponibiliza_palestras_sobre_Direito_Sistemico

[6] LUCACHINSKI, Camila Schroeder; LIPPMANN, Marcia Sarubbi. O ADVOGADO PEACEMAKER E A ABORDAGEM SISTÊMICA NA ADVOCACIA.CADERNOS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA, [S.l.], v. 2, n. 2, abr. 2018. ISSN 2526-0537

[7] Holístico ou holista é um adjetivo que classifica alguma coisa relacionada com o holismo, ou seja, que procura compreender os fenômenos na sua totalidade e globalidade. Disponível em https://www.significados.com.br/holistico/

[8] Confira as terapias alternativas que já são aceitas pelo SUS. Disponível em: http://portalms.saude.gov.br/noticias/agencia-saude/42737-ministerio-da-saude-inclui-10-novas-praticas-integrativas-no-sus

Equipe de Direito Trabalhista

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