09/09/2025

Itaú e as Demissões: Produtividade é Tempo ou Resultado?

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A recente notícia de que o Itaú Unibanco teria promovido a dispensa de aproximadamente mil trabalhadores em regime remoto ou híbrido na última segunda-feira (08/09/2025) após avaliar suposta “produtividade” reacende um debate sensível e necessário sobre os limites do controle patronal e a verdadeira concepção do que seja produtividade no home office

Segundo divulgado, as demissões decorreram de uma “revisão criteriosa de condutas relacionadas ao trabalho remoto e registro de jornada”, com indícios de que alguns empregados teriam permanecido longos períodos em inatividade perante os sistemas internos do banco. 

O discurso institucional, ao justificar tais desligamentos como forma de “preservar a cultura de confiança”, contrasta com a crítica sindical, que aponta ausência de diálogo, advertência ou possibilidade de defesa dos trabalhadores.

O ponto central dessa discussão transcende os fatos narrados e revela um dilema estrutural: Ainda hoje, confunde-se produtividade com horas trabalhadas. Esse raciocínio linear, típico da era industrial, desconsidera a lógica do trabalho intelectual e digital, no qual a entrega de resultados, a qualidade da atividade e a capacidade de inovação importam mais do que a permanência física ou virtual diante de uma tela.

No home office, especialmente, o controle de jornada enfrenta limites jurídicos e práticos. 

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em seu artigo 62, inciso III, prevê que empregados em regime de teletrabalho podem estar dispensados de controle de jornada justamente porque o foco não deve estar no tempo, mas sim nos resultados. 

Ainda que empresas possam, mediante ajustes contratuais e tecnológicos, acompanhar horários, isso não pode ser convertido em ferramenta de vigilância excessiva, capaz de invadir a privacidade e reduzir a relação laboral a mera contagem de cliques e acessos em plataformas corporativas.

É certo que o empregador tem o direito de zelar pela boa-fé e pela confiança na execução das tarefas. Todavia, quando a gestão se ancora apenas em métricas quantitativas de tempo conectado, perde-se de vista a essência da produtividade. 

Um trabalhador pode passar horas conectado sem entregar nada de valor, assim como pode cumprir sua demanda com eficiência em período muito menor do que a jornada formal. A insistência em equiparar inatividade técnica a ineficiência funcional traduz mais uma ânsia de controle do que uma verdadeira busca por resultados.

Outro ponto que merece reflexão é a forma abrupta e unilateral dos desligamentos noticiados. A dispensa sem prévia advertência, sem espaço para diálogo ou correção de conduta, além de fragilizar a confiança recíproca que o próprio banco diz prezar, abre margem para discussão jurídica acerca do abuso do poder diretivo. 

A justa causa, por exemplo, exige gradação de penalidades e comprovação inequívoca de falta grave, sob pena de nulidade. Já a dispensa sem justa causa, ainda que lícita, quando massiva e baseada em critérios questionáveis, coloca em xeque princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana e a função social da empresa além do princípio basilar do direito do trabalho, que é o da proteção ao emprego.

O episódio revela, em última análise, que parte dos empregadores ainda está presa a um modelo arcaico, em que produtividade equivale a tempo visível de trabalho. 

Essa lógica, além de desatualizada, contraria as tendências modernas de gestão, que valorizam flexibilidade, autonomia e foco em resultados. O trabalho remoto exige confiança, clareza de metas e mensuração de entregas, e não a simples fiscalização de horas logadas em um sistema.

Portanto, o debate que se impõe não é apenas sobre a legalidade das demissões, mas sobre a mentalidade empresarial que insiste em medir a produtividade no home office por parâmetros ultrapassados

Enquanto não houver uma mudança cultural que reconheça o valor do trabalho para além da quantidade de horas conectadas, continuaremos a presenciar conflitos como este, em que o discurso da confiança se esvai justamente pela tentativa excessiva de controle.

Por Gabriella Ferreira Nicholls

OAB/MG 185.363

 

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